Cinema Cearense em Tempo de Criação*

11 de setembro. Foi nessa data – de triste memória recente - que, no ano de 1897, em um teatro de 500 lugares situado na Rua Senador Pompeu, o cinema deu-se a conhecer pelos cearenses. Foi amor à primeira vista. Eram tempos de novidades revolucionárias, como a criação dos primeiros jornais, a instalação das fábricas têxteis, a chegada do telefone, do fogão a gás e do fonógrafo, a “máquina que canta, fala, toca e ri”, como anunciou um jornal da época. O Ceará - e particularmente Fortaleza – parecia estar em pleno movimento e nenhum meio se mostrava mais apropriado para expressar essa sensação do que o cinema.


Apesar da sedução causada pelo poder de registro daquela nova mídia, ficamos na condição de espectadores de outros tipos e paisagens até o ano de 1910, quando vimos, pela primeira vez, nosso rosto: “A Procissão dos Passos”, um documentário, estreava no Cinema Rio Branco, no dia 1º de abril. Parecia mentira! Sim, éramos nós, não havia dúvida! Nós e nossa fé nas coisas intangíveis, ladeados pelo casario construído por nossos antepassados, igualmente gente de fé. Mas quem era o pai daquelas imagens? Quem havia apontado a câmera na direção daquele povo que buscava, de maneira fervorosa, atrelar-se aos céus e ao projeto de modernidade propagado pela então jovem República? Nunca se soube.

Tivemos que esperar até 1924 - mais precisamente, até o dia 15 de outubro - para que um filme que nos retratasse fizesse o registro de um nome: Adhemar Albuquerque. O filme, o documentário “Temporada Maranhense de Foot-Ball no Ceará”, entrava para a história como a primeira produção realizada, indubitavelmente, por um cearense. Concretizava-se, por intermédio desse pioneiro, o nosso desejo de gravarmos, em película cinematográfica, nossa própria história.

Nas décadas seguintes, como que complementando o roteiro de imagens iniciado por Adhemar, vários de nós, de forma quase sempre independente e criativa, buscaram estabelecer condições mínimas de continuidade produtiva. Entretanto, mesmo com a paisagem múltipla, a diversidade de tipos humanos, as histórias, o talento e a disposição dos iniciados, os recursos continuavam minguados. Era preciso uma nova revolução para que esse desejo ganhasse alento. E ela veio, com nome e sobrenome: tecnologia digital.

O Ceará, como não poderia deixar de ser, encontra-se imerso nessa era onde o uso conjugado da imagem e do som, associado à convergência digital, expande nossos olhares em torno dos aspectos múltiplos da cultura humana. A cada dia - e a despeito da intermitente política audiovisual que tem caracterizado a ação do poder público - novos cursos, festivais, escolas, realizadores e, principalmente, filmes, surgem das mais variadas formas e nos mais diversos quadrantes dessa terra do revolucionário José de Alencar que, se tivesse conhecido o cinema, muito provavelmente teria pensado em dirigir um longa-metragem chamado, sugestivamente, Iracema.


*Artigo originalmente publicado no jornal cearense O Povo (Caderno Opinião, em 19/10/2008).

Nenhum comentário: