O Cinema Segundo Truffaut

"Pode-se dizer, de maneira resumida, que o cinema conheceu três estágios: o mudo, quando o filme era uma realização física, época de Griffith e John Ford. Fazer um filme era então se dispor a fazer tudo, a enfrentar os maiores imprevistos. O diretor carregava sobre si o peso de um filme e de um material considerável. Devia orquestrar milhares de figurantes. O melhor exemplo de diretor do cinema realizado na época era Griffith. E o grande esbanjador era Cecil B. De Mille.

Ao passar a ser falado, o cinema se intelectualizou. Tornou-se um subproduto do romance e, sobretudo, do teatro. Transformou-se num produto semi-intelectual. Essa época pode ser ilustrada no pior sentido pela dupla Feyder-Spaak e, no melhor sentido, por Prévert e Carné.

Atualmente, vive-se o terceiro estágio: o dos intelectuais, quando não está mais em jogo o desempenho físico, em que todos os problemas técnicos são resolvidos por uma equipe numerosa e altamente competente. As cenas são tão bem realizadas quanto as do décimo quinto filme de qualquer grande diretor. Em outras épocas isto teria sido absolutamente impossível. No presente, o cinema está nas mãos de intelectuais, isto é, com pessoas que em outras circunstâncias poderiam ter escrito romances ou peças de teatro, que dez anos atrás certamente teriam preferido escrever romances ou peças por medo da técnica. Nós vivemos o momento do cinema do autor. Claro, o cinema intelectual corre o risco de, em pouco tempo, tornar-se vazio e abstrato. Mas tem também boas chances de tornar-se mais inteligente, forte e sincero do que nos períodos precedentes.

O desafio para os novos cineastas é recuperar a saúde do cinema mudo, saúde formidável e única coisa que pode evitar que nosso cinema se torne irritante, complicado, chato e sem vida. É preciso reaver o primeiro período do cinema e se rejeitar em bloco todo o segundo período, que atualmente se apresenta como um estágio de transição.”

Trecho da entrevista concedida por François Truffaut a Chris Petit e Verina Glaessner (Time Out, nº 197, de 30 de novembro a 6 de dezembro de 1973) contida no livro "O Cinema Segundo François Truffaut", de Anne Gillain - Editora Nova Fronteira.

2 comentários:

Nirton Venancio disse...

Olá, Duarte. Não conhecia seu blog. O twitter me apresentou.

Abraços,

www.olharpanoramico.blogspot.com
www.nirtonvenancio.blogspot.com

Duarte Dias disse...

Olá, Nirton. Seja bem-vindo.

Saiba que acompanho seu blog (na verdade, SEUS, já que são dois) e aprecio muito o que você escreve. Parabéns.

Abraço.